“Algumas vezes, a coisa mais difícil é a mais certa”. Ouvira isso
em algum lugar, em alguma música sussurrada, com algum sorriso roubado e vinho
tinto para acompanhar. Porque apenas o toque suave da voz grave em sua pele era
suficiente para tornar até a pior frase a melhor das maravilhas.
Sentada no chão frio do banheiro, ela agora revia os acontecimentos anteriores.
Revia os beijos, os abraços. Lamentava-se por cada uma das palavras que
sussurrara e por ter sido fraca ao não conseguir dizer não.
Desde o começo, não devia ter começado com aquela história. Porque, no fundo,
sabia como aconteceria. “Algumas vezes, a coisa mais difícil é a mais certa”...
Tudo o que tinha era sua família, os braços aconchegantes da mãe, os sorrisos
roubados, os doces compartilhados, o olhar travesso da irmã, os segredos
abafados, as noites viradas em claro. E havia também toda aquela magia que só
existia quando referia-se a elas. Era difícil aceitar...
Ali, sentada com a garrafa de vinho barato e com olheiras, a cabeça latejando
pela dor e o estômago revirando com o pesar, ela teve ainda mais certeza disso.
O laço que as unia era único. E restringia-se às três. Era delas. E elas eram
suas.
Mais um gole no vinho nojento. Mais uma lágrima que insistia em cair enquanto a
lembrança voltava. Era uma escolha difícil. Como era...
“Querido Amor,
Sinto muito.”
Foi o que teve coragem de rabiscar dessa vez. Nenhuma palavra a mais, nenhuma
palavra a menos. Porque já não havia o que dizer. Já não podia mais dizer.
Colocar sentimentos em palavras pode ser perigoso. E ela sentia-se frágil
demais para correr mais um risco.
Deixou o corpo deitar no azulejo frio e fechou os olhos. E no sonho, nada
daquilo jamais havia existido. Sem dor, sem culpa, sem nada para separá-los ou
não. Nenhuma prioridade.
Nada. Paz.