- Você acredita mesmo que... – A frase foi interrompida por
um sorriso cálido da irmã mais velha. Deslizou os dedos machucados pelos
fantasmas no rosto de criança e assentiu, umedecendo os lábios e erguendo o
olhar em busca de algo.
- E você não? – A maior sussurrou, apertando as mãozinhas
pequenas nas suas.
A criança mostrou-lhe um sorriso lindo e a gargalhada
gostosa ecoou pelo quarto, envolvendo-as. Unindo-as, levando embora a tristeza
que parecia pairar no quarto. Por um momento, a pequena pareceu pensar,
raciocinar.
- É que nós não vemos muitos anjos por aí... Você sabe. –
Ela riu, de forma sapeca. E a irmã mais velha teve de conter-se para não
apertá-la num abraço que iria sufoca-la por alguns segundos.
- É só porque não conseguimos enxergar. Basta só um
pouquinho de atenção, quer ver?
- E você pode me mostrar?
- Respire fundo e venha comigo nessa – Sussurrou,
aninhando a pequena em seu colo e afagando-lhe o rostinho de boneca. – Você
sabe aqueles momentos em que nós estamos tristinhas?
A menina assentiu, sem nem se preocupar em dar um tempo
de pausa para a irmã, que riu antes de prosseguir: - Certo, você sabe... Hm.
Nesses momentos, existem pessoas que, só de nos olhar nos olhos, conseguem
saber o que estamos sentindo. E é mágico como elas conseguem nos animar,
pequena... Você já percebeu isso?
Novamente, a expressão pensativa tomou o rostinho da
criança, aninhada no colo da irmã mais velha. Ela mordiscou um dos lábios finos
e assentiu em seguida, erguendo as orbes douradas e sorrindo para a maior
apenas com o olhar.
- Você é uma dessas pessoas. Não é? Você sabe fazer
mágica.
E a irmã mais velha riu, enchendo a barriguinha da menor
de cócegas, fazendo-a rir. Fagulhas de esperança encherem o cômodo e o ar. Tudo
se fez mais claro com o riso sincero e doce. A maior meneou a cabeça e
abraçou-a carinhosamente.
- Talvez eu seja. – Sussurrou, como um segredo. – Mas o
ponto que quero chegar, Pipoquinha, é este: essas pessoas, essas pessoinhas que
nos fazem felizes quando parece impossível, esses são nossos anjos. Anjos aqui,
na Terra. E bem do nosso lado – O tom de segredo continuava, o sussurro
enchendo o quarto, a esperança parecendo crescer na expressão da menor e no
quarto fétido.
- Farinha de Trigo... Eu acredito. – Sussurrou, o segredo
também presente na voz fina e doce. – Eu acredito – Repetiu, apertando a irmã e
assentindo fervorosamente.
A maior depositou um beijo na testa da irmãzinha e
assentiu, deslizando a pontinha do nariz na dela. Depois de suspirar e sentir o
ar mais leve no quarto que antes abrigara a morte, ela umedeceu os lábios
novamente e criou coragem para sussurrar: - Que bom que você acredita... Você é
o meu anjo. – Confessou, prendendo-se à pequena.
E juntas, todas as feridas elas curaram.
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